3 de maio de 2014

COMO SUA EMPRESA LIDA COM FUNCIONÁRIOS EGOCÊNTRICOS?

Imagine as seguintes situações:

-  Você está na fila de algum estabelecimento esperando sua vez para ser atendido e outra pessoa entra na sua frente.

-  Você está dirigindo seu carro e, inesperadamente, leva uma fechada de outro veículo.

-  Você caminha pela rua e é abordado por um assaltante que leva seus pertences.

É possível afirmar que, nos exemplos acima, as pessoas agiram com o intuito de prejudicar você? De acordo com especialistas, não. Trata-se de atitudes egocêntricas, em que cada um só pensou em si. Veja: a pessoa que passou a frente na fila não pensou nas outras que já estavam ali, o motorista não se importou se o outro também tinha pressa e o assaltante não pensou na sua perda, somente na necessidade de conseguir dinheiro. O mesmo acontece nas organiza­ções. É cada vez mais comum encon­trarmos líderes vaidosos, prepotentes e egocêntricos, que não pensam nem mesmo nos valores, metas e objetivos da empresa na qual trabalham. Mas como esses profissionais podem ser líderes? De que maneira eles agregam valores junto à equipe se, na prática, somente seus interesses importam?

De acordo com Vanessa Pinzon, psiquiatra do Instituto de Psiquiatria da Universidade de São Paulo, todos somos egocêntricos por natureza e necessidade. Portanto, precisamos estar atentos à nossa preservação e sobrevivência, o que exige cuidados sempre. A psiquia­tra, porém, alerta para o fato de que alguns seres humanos podem se tomar excessivamente egocêntricos. Segundo ela, tal mecanismo se desenvolve por vários motivos e um deles está ligado às características de personalidade. "Nesse caso, o egocentrismo excessivo é uma característica que compõe a personalidade desse indivíduo, ou seja, ele está predominantemente voltado para si mesmo e tem muita dificuldade de negociar, flexibilizar, perceber e se colocar no lugar do outro. Não vê os sofrimentos ou as necessidades daqueles que o cercam. Ele está sempre em primeiro lugar para tudo", diz.

Entenda os mecanismos do nosso comportamento:

Ego - Sua principal função é nos manter vivos, preservar-nos a qualquer custo. É responsável pela parte consciente da mente, pela tomada de decisões e integração dos dados percebidos da realidade. Há também uma parte inconsciente, responsável pelos mecanismos de defesa, utilizados quando há um aumento de tensão ou ansiedade. Exemplo: permite que alguém perceba que deve se calar em uma situação. Se há perigo em atra­vessar a rua, deve-se olhar para os dois lados antes de fazê-lo.
ID - Completamente inconsciente, refere-se aos aspectos de satisfação, prazer ou eliminação de sofrimento ou qualquer desprazer sentido pela mente. Exemplo: não assistir a uma aula por achar o assunto chato.

Superego - Também é predominantemente inconsciente e incorpora regras e aspectos morais. Exemplo: permite discernir que não se pode roubar ou fazer mal a alguém.
Fonte: Vanessa Pinzon, psiquiatra. Com base nas estruturas da mente definidas na teoria estrutural. Postulada por Freud.
• Identificando um perfil egocêntrico na empresa

Em meio à diversidade de perfis que encontramos dentro de uma organização, nem sempre é fácil identificar, à primeira vista, um comportamento egocêntrico entre os colaboradores. Mas, com o tempo, a presença de indivíduos com traços extremos de egocentrismo se torna facilmente perceptível. Isso porque, de acordo com o médico e palestrante Lair Ribeiro, os egocêntricos são aqueles que têm muita dificuldade de conviver em grupos, sejam eles familiares ou profissionais. "Esse tipo de comportamento leva o indivíduo a ser uma pessoa extremamente subserviente ou arrogante", explica o médico.

Lair afirma que, nos dois casos, o problema é o mesmo: auto-estima. "Pessoas egocêntricas não acreditam suficientemente nelas e geram uma compensação, que traz certa defor­mação", afirma. Para ele, esse tipo de comportamento ocasiona signi­ficativos danos sociais, tanto para a pessoa quanto para aqueles que convivem com ela. "Indivíduos ego­cêntricos ao extremo frequentemente demonstram um comportamento indiferente às necessidades alheias, o que acaba gerando mal-estar na equipe, afastamento dos outros e não agregando resultados positivos para a empresa", explica.

Líderes egocêntricos:

"Um líder precisa ter presença, gerar credibilidade e ser uma pessoa resol­vida, que coloca o que é importante para os outros na frente do que é importante somente para ele", reforça Hilário Trigo, especialista em coaching e desenvolvimento organizacional. Para ele, aquele líder que a todo momento reflete se o feedback que está dando está correto, se a forma de se comunicar com seus liderados é viável e só fica se auto-analisando é inseguro e não vive a liderança como deve ser vivida. "Ele não se permite jogar o jogo para ganhar, muito menos treinar novos líderes, por medo de outros tomarem o lugar dele", enfatiza.

Diante do exemplo acima, poderí­amos listar alguns cases de empresas que viveram tal experiência, mas preferimos ilustrar com uma história universal. Quem nunca leu o livro ou assistiu ao filme O diabo veste Prada? Na trama, inspirada na realidade vivida na revista Vogue, Miranda Priestly, interpretada por Meryl Streep, é editora de uma revista de moda. Seu comportamento como líder é dos mais autoritários, egocêntricos e questionáveis. Para ela, nada está bom, o que dirá perfeito. As tarefas mais inimagináveis são determina­das à sua equipe, que tem de fazer o impossível para atender aos seus ca­prichos, muitos de cunho pessoal.

Em nosso dia a dia, convivemos com líderes parecidos com Miranda, que só pensam em si e no seu cresci­mento dentro da organização, indo de encontro aos princípios fundamentais de um líder. "Liderança diz respeito a pessoas, é conduzi-Ias para que 'cheguem a um propósito maior, e não impor. É o que importa para a equipe, a empresa e as pessoas que estão ao seu lado", afirma Hilário. Ele complementa ainda que, quando um líder olha somente para dentro dele, para suas metas, objetivos e tudo o que é importante apenas para seus interesses, ele para de olhar sua equipe, "A partir desse momento, deixa de ser líder e não gera resul­tados positivos para a empresa, É um chefe ou um gerente, mas não um líder", explica,

A presença do ego e a competitividade:

Imagine uma competição olímpica. Apenas um será o vencedor, porém todos entram com um mesmo propó­sito: vencer. No entanto, nem todos treinam o suficiente para ganhar. Uns podem se dedicar durante um ano inteiro para tal competição, outros treinam com menos afinco. Mas apenas um sairá vencedor.

Situação semelhante acontece no dia a dia das empresas. A maioria dos funcionários almeja os melhores cargos e salários, porém nem todos estão capacitados para ocupar tais posições. Ainda assim, sempre haverá competição entre os colaboradores, haja vista a diversidade de níveis de conhecimentos, habili­dades, atitudes, cultura, entre tantos outros quesitos fundamentais para alcançar uma vaga ou ser promovido. Em meio a diversos perfis dentro de cada equipe, é possível identificar a existência de uma característica comum: a presença do ego.

Tanto a diversidade quanto a presença do ego podem ser saudá­veis no ambiente organizacional. "É o que faz as pessoas se motiva­rem, crescerem e lutarem por seus objetivos. Se todas as cores fossem iguais, qual seria a beleza do arco­ íris?", avalia Lair Ribeiro. Para ele, gerar competitividade é gerar conflito, o que é sempre positivo em uma equipe. São justamente essas diferenças de personalidade que criam o verdadeiro desafio para as pessoas e empresas. "Organizações que têm indivíduos com a mesma personalidade não são competitivas.

O diferente é o que estimula o egocentrismo moderado e a competição entre as pes­soas. “Por isso, “as empresas mais competitivas são aquelas em que encontramos profissionais de todas as cores, para fazer o arco íris”, justifica.”

Como lidar com os egocêntricos:

Há duas palavras funda­mentais quando o assunto é o convívio com pessoas egocêntricas no ambiente de trabalho: adaptação e alinhamento. Para Lair Ribeiro, com base em um pensamento de Charles Darwin, "não são as espécies mais fortes nem mais inteligentes que irão sobreviver, mas sim as com maior capacidade de adaptação".

Por esse motivo, ele afirma que se adaptar é a melhor maneira para lidar com o egocentrismo no trabalho. "Se você tem um líder autoritário e não aguenta mais a pressão do tra­balho, pode pedir demissão, afinal, você não nasceu lá. Também tem a opção de se adaptar ao seu líder. Se ele é egocêntrico, encontre maneiras de falar com ele", explica. Se fosse fácil, o problema estaria resolvido. A questão se torna difícil, pois, na maioria das vezes, os pro­cessos de adaptação não são simples. "É como se fosse um renascimento. Para renascer, é preciso passar pelo canal do parto, sempre menor que o diâmetro da cabeça do feto - então vai doer. E a tendência natural do ser humano é evitar qualquer tipo de dor", assegura Lair.

Hilário Trigo atenta para outro fator fundamental: a importância de ter um ambiente corporativo ali­nhado entre os valores pessoais e os da organização. De acordo com ele, é preciso, antes de tudo, engajar as pessoas: "Engajamento é à base do alinhamento e você só consegue isso perguntando para os indivíduos o que é importante para eles. Se você faz  isso, descobre o valor dessas pessoas. Quando elas não estão alinhadas com os valores da empresa, acabou. Não há mais como insistir nessa relação entre empresa e colaborador". Nesse caso, a presença de um líder egocêntrico pode ser altamente prejudicial aos resultados da em­ presa, uma vez que indivíduos que desenvolveram tais características a um grau extremo não interagem, não compartilham nem agregam valores. Muito pelo contrário, só olham para seus propósitos pessoais. "Eles não conseguem corresponder às expectativas da empresa, tampouco ajudar liderados com as mesmas características", garante.

A chave para toda a questão:

Para concluir, voltemos às situações sugeridas no início desta matéria.

- Você está na fila de algum estabelecimento esperando sua vez para ser atendido e outra pessoa entra na sua frente.

- Você está dirigindo seu carro e, inesperadamente, leva uma fechada de outro.

- Você caminha pela rua e é abor­dado por um assaltante que leva seus pertences.

Agora fica mais fácil entender por que, no fundo, os egocêntricos não realizam nada contra nem a favor de você. Eles fazem simplesmente por eles mesmos, por serem os mais importantes.

A chave para toda essa questão é ter consciência da ilusão ocasionada pelo egocentrismo. É o que garante Hamilton Bastos, terapeuta e autor do livro Egocentrismo: a doença. Ego: o vírus. "Escrevi o livro justamente para fazer com que as pessoas co­mecem a refletir sobre a questão de que tudo - as situações e relações, a sensação de posse sobre indivíduos e coisas - é uma grande ilusão que gera o egocentrismo. Por isso é tão difícil trabalhar com egocêntricos - as pessoas ainda resistem em se conscientizar de que é preciso deixar de se sentirem o centro", diz.

EXERCÍCIO PARA AMENIZAR O EGOCENTRISMO

"Você mentaliza todos que conhece - amigos, inimigos, parentes, pessoas próximas, distantes - o máximo que puder. Dessa forma, começa a não se sentir o centro, porque nesse momento estará dividindo. Esse é o antídoto do egocentrismo. É uma prática que poucas pessoas conseguem fazer, pois pode parecer uma coisa absurda ficar desejando saúde, paz e felicidade para cada indivíduo. Mas garanto que, mentalizando até aquele seu pior inimigo em estado de saúde, paz e felicidade, você estará, certamente, diminuindo a sensação de que é o mais magoado, o mais infeliz, o mais injustiçado. Observando tais sensações, estará percebendo a si mesmo conscientemente, por isso esse exercício é importante. Você começa a se sentir integrado com o mundo, e não à parte dele, assim a sensação de egocentrismo vai reduzindo e você passa a se sentir uma pessoa melhor."

Para lidar com líderes e funcionários egocêntricos:

- Identifique tal característica no colaborador. Ter consciência de que isso existe e ajudá-Io na dificuldade de olhar para fora de si e perceber o outro é funda­mental.

- Desenvolva um modelo de comunicação diferenciado com esse funcionário.

- Entenda o que é importante para ele. Aborde a questão dos valores pessoais.

- Descubra quais são suas necessidades e conquiste sua confiança.

- Pergunte qual é a missão e os valores dele.

- Em seguida, alinhe os valores e a missão do profissional com os da empresa.

- A partir de então, você terá melhores condições de trabalhar outras questões, como objetivos e metas.

- Estabeleça limites e mensure as vantagens e desvanta­gens em permanecer com um colaborador ou um líder egocêntrico na empresa.

- A dica final é: se você possuir pessoas alinhadas com a missão e os valores da empresa, vale tentar. Se não tiver os mesmos interesses, não há jeito. O melhor é demitir!

Fonte: Revista Liderança – Por Pauline Machado

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