1. Introdução
No Brasil, muitas empresas estão “desenterrando” ou revendo seus planos de investimentos após anos de espera dado as otimistas perspectivas futuras de crescimento do mercado interno, diante, principalmente, do apetite voraz das classes C e D por novos produtos e serviços.
Nos próximos anos, bilhões de reais serão investidos na ampliação da capacidade produtiva, e, em paralelo aos investimentos em produção, existirão ações-chave na área de Logística, que envolverão decisões estratégicas relacionadas a pessoas, processos, infra-estrutura física e tecnologia da informação.
Essas ações são imprescindíveis para a viabilização dos planos de expansão da empresa, e sem elas, a logística se constituirá no grande “gargalo” de seu negócio.
Infelizmente, poucas empresas realmente valorizam o desenvolvimento e a efetiva implantação de um Plano Diretor de Logística. Focam seus esforços e atenções para as iniciativas em Produção, Finanças, Vendas e Marketing, e esquecem que seus objetivos finais apenas serão atingidos a partir de uma bem estruturada rede logística.
2. Por que ter um Plano Diretor em Logística?
Diante dessa desafiadora realidade, torna-se imprescindível desenvolver e implantar um Plano Diretor em Logística, no qual serão definidas ações-chaves relativas à cadeia de abastecimento no curto, médio e longo prazo.
Acostumados a agir como verdadeiros “bombeiros”, apagando intermináveis incêndios, os profissionais da área logística pouco desenvolveram a visão tática e estratégica, dificultando o planejamento a médio e curto prazo.
Mas, afinal, por que desenvolver um planejamento estratégico em logística?
A logística deve ser considerada cada vez mais um diferencial competitivo para as empresas. Diante da inevitável “comoditização” de produtos e serviços, empresas concorrentes realizarão intensos combates na esfera logística. Caberá à área de logística viabilizar a entrega do produto certo, na quantidade correta, na qualidade justa, no lugar certo, no tempo correto, no método adequado, a um custo justo, causando uma boa impressão.
Além disso, o cenário atual é de extrema complexidade e o futuro seguramente nos reservará novos desafios. O número de itens comercializados é cada vez maior tornando difícil o aproveitamento cúbico dos armazéns e o inventário dos materiais, novos controles são exigidos a cada novo dia demandando novas tecnologias e processos, novos canais de distribuição são explorados criando obstáculos para a unitização das cargas, restrições à circulação de veículos dificultam a entrega nas grandes cidades, a mobilidade urbana afeta a produtividade dos veículos e contribui para a elevação dos custos, a logística reversa aumenta de intensidade e dificulta a operação dos Centros de Distribuição, a sazonalidade de vendas gera “picos” na operação exigindo maiores gastos com horas-extras e maior necessidade de transporte. Quer mais? Com certeza novos desafios virão e precisaremos dispor de rápidas respostas para tudo.
3. Como desenvolver um Plano Diretor em Logística?
Afinal, por onde começar algo tão difícil e complexo, que é o planejamento estratégico em logística?
O nível de serviço aos Clientes pode ser considerado o ponto de partida para o desenvolvimento de um Plano Diretor em Logística.
A partir de uma visão clara e objetiva daquilo que se deseja ofertar aos Clientes nos diferentes canais de distribuição atendidos, será construída uma ampla proposta, traduzida em ações que contemplem infra-estrutura operacional, tecnologias para a gestão, capacitação da equipe e revisão dos processos sob a ótica de valor agregado ao cliente interno e externo.
Não parta exclusivamente de uma comparação com o mercado. O que é bom para o seu concorrente poderá não ser bom para você, ou poderá se positivo, mas em proporções diferentes.
O primeiro passo deve ser o correto entendimento dos principais atributos valorizados pelos clientes. Isso pode ser obtido através de um brainstorming interno, envolvendo as áreas de Marketing, Vendas, Finanças, Produção e Logística, mas também através de uma abordagem qualitativa e quantitativa junto aos principais Clientes dentre os canais de distribuição prioritários. Nas entrevistas junto aos Clientes, recomendo a realização de entrevistas pessoais com profissionais de alto escalão, seguindo um script pré-estabelecido, com pontos chaves a serem abordados, mas também reservando espaço para temas não previstos na metodologia aplicada.
Se achar interessante, também convoque alguns Fornecedores para participar desse processo inicial.
O segundo passo envolve o aprofundamento nos key drivers elencados no passo anterior. Ao identificarmos, por exemplo, como atributo primário a questão da informação e visibilidade, precisamos ter um claro entendimento do que isso realmente significa. O que o Cliente quer realmente dizer com isso?
O terceiro passo trata do desenvolvimento do modelo operacional ideal, aderente aos atributos primários detalhados. Pode ser realizado em um workshop interno envolvendo as principais lideranças da área de logística. Envolverá infra-estrutura, pessoas, processos, tecnologia e sistemas de gestão.
Nesse terceiro passo pode ser interessante para a sua empresa o desenvolvimento de um processo de benchmarking (comparação com melhores práticas) com empresas similares. A visita a outras empresas, embora muitas vezes possa consumir tempo adicional da equipe, é importante e deve ser relevada pelos responsáveis pelo desenvolvimento do Plano Diretor.
O quarto passo, que pode ocorrer no mesmo workshop, envolve uma análise de gap, identificando quais os impactos na atual sistemática de gestão da área de logística, processos-chave, estrutura organizacional e quadro de funcionários, competências e habilidades, ferramentas tecnológicas e infra-estrutura.
A partir das informações reunidas nos quatro passos citados, será possível dar andamento ao quinto passo, concluir a análise e estabelecer as ações-chave, as prioridades, o prazo para execução e o orçamento. O gestor responsável pela área deverá complementar o material com análises financeiras, comprovando a viabilidade das medidas tático-estratégicas, através de ferramentas de engenharia econômica como TIR - Taxa Interna de Retorno e VPL – Valor Presente Líquido.
O Plano Diretor deverá ser submetido à aprovação da Diretoria Geral da empresa. Se aprovado, procederemos ao sexto passo. Caso não seja aprovado, precisaremos recorrer aos passos anteriores.
No sexto passo deverá ocorrer o desdobramento das metas e dos planos de ação, detalhando as ações, os responsáveis e o cronograma detalhado do Plano Diretor.
Por fim, no sétimo passo, será realizado o monitoramento dos resultados alcançados e os ajustes necessários para a correção dos desvios ocorridos em relação às metas estipuladas.
4. Ações-Chave e seu Horizonte Temporal
O Plano Diretor em Logística envolve ações de curto, médio e longo prazo.
Embora as ações-chave estejam previstas em prazos diferentes, todas estão inter-relacionadas e o seu encadeamento é fundamental para o sucesso do Plano Diretor.
As medidas de curto prazo, normalmente, estão relacionadas aos processos-chave da empresa e aos recursos humanos, e lidam com um horizonte temporal que varia de 3 (três) meses a 12 (doze) meses. Envolvem a revisão dos processos, com o foco de identificar e eliminar redundâncias e lacunas. Pode ser realizada de forma exaustiva, considerando todos os processos ou objetiva, priorizando processos de maior impacto em resultados ou de maior criticidade.
Em casos que envolverem o desenvolvimento de novas competências, como é o caso, por exemplo, da gestão da logística reversa, essas ações poderão se enquadrar dentro de prazos superiores ao estimado no curto prazo, se estendendo por alguns meses além do previsto, “invadindo” a esfera do médio-prazo.
Quanto a pessoas, quais as habilidades e competências necessárias para superar os desafios atuais e futuros? Aqui é preciso avaliar se dispomos de tais recursos e quaisl os investimentos necessários para a capacitação da equipe.
As ações de médio-prazo tratam de iniciativas em modelos de gestão, tecnologia da informação e infra-estrutura física, e operam em um prazo de 12 (doze) meses a 24 (vinte e quatro) meses.
Modelos de gestão podem tratar, por exemplo, da revisão da política de estoques de matérias-primas, MROs (itens de manutenção, reparos e suprimentos operacionais), peças de reposição (spare parts) e produtos acabados.
Também podemos prever em nosso Plano Diretor iniciativas relacionadas a programas de qualidade e produtividade em transportes e em Centros de Distribuição, atrelando uma parcela da remuneração dos funcionários e parceiros logísticos (Transportadoras e Operadores Logísticos, por exemplo) ao desempenho na operação.
Ainda em modelos de gestão, podemos incluir questões relativas à terceirização de atividades logísticas (outsourcing), analisando os prós e contras, qualitativos e quantitativos da operação própria versus a operação terceirizada.
No caso da tecnologia da informação, envolvem a implantação de novas ferramentas informatizadas como sistemas WMS – Warehouse Management System, TMS – Transportation Management System, automação parcial da operação logística (o uso de flow-racks, por exemplo), automação total (transelevadores, por exemplo), soluções para a roteirização de cargas, WEB/WAP (protocolos para aplicação sem fio), etc.
Na frente de infra-estrutura física podem representar mudanças no layout operacional, ampliação de centros de distribuição, etc.
As ações de longo prazo estão diretamente envolvidas com o modelo operacional, a infra-estrutura física e tecnologia da informação.
Aqui reside o maior desafio dentro das ações de um Plano Diretor, o redesenho da malha logística. Como estruturar a operação? Qual a natureza operacional das instalações: centros de distribuição, centros de distribuição avançados (CDA), cross-docking ou transit-points (TP)? Onde, especificamente, estarão localizadas as instalações físicas? Quais os benefícios fiscais existentes para os diferentes cenários? Que modais serão utilizados e com qual finalidade?
Em termos de infra-estrutura física poderemos, por exemplo, tratar da ampliação da capacidade operacional, com a construção de novos Centros de Distribuição ou da mudança de um determinado site logístico.
Artigo escrito por Marco Antonio Oliveira Neves, Diretor da Tigerlog Consultoria e Treinamento em Logística Ltda. para a Revista Mundo Logística em 2011.
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