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14 de março de 2012

VMI - ESTOQUE GERENCIADO PELO FORNECEDOR

Uma introdução aos principais conceitos, tecnologias e aspectos a considerar em um projeto de implantação do VMI.

Estabelecer alianças estratégicas entre fornecedores e clientes é um passo fundamental para contribuir positivamente no desempenho de qualquer cadeia de suprimentos e demanda. Uma aliança significa cooperar de tal forma que haja o compartilhamento dos riscos e das recompensas, atingindo uma performance superior àquela que seria possível agindo individualmente. Nessa linha, o presente artigo abordará os principais conceitos, tecnologias e aspectos a considerar em um projeto de implantação de uma das principais iniciativas de cooperação e integração em uma cadeia de valor: o VMI.

A intensa competição global entre as empresas já não é mais uma novidade. A pressão por redução dos custos e aumento dos lucros está cada vez mais acentuada, fazendo com que empresas de todos os portes e segmentos busquem aumentar a sua competitividade através da melhoria dos seus métodos e processos, bem como através do uso intenso de tecnologias.

A novidade em todos estes fatos é que cada vez mais empresas têm percebido que trabalhar de forma colaborativa e integrada ajuda a diminuir as incertezas inerentes a um ambiente cada vez mais dinâmico e de difícil previsibilidade.

Esta constatação é evidenciada pelo destaque dado, principalmente nesta década, para alguns conceitos que remetem à colaboração da gestão da cadeia de suprimentos e demanda e que buscam, de um lado, aumentar a acurácia da previsão de vendas, o nível de serviço, as vendas, a receita e o giro de estoques e, de outro, diminuir o nível de estoques, o tempo de resposta,
os custos logísticos e os atrasos.

No entanto, apesar do crescimento da colaboração e da integração, a realidade da maioria das empresas ainda é o não-compartilhamento ou o compartilhamento básico de informações. Um exemplo disso são os pedidos feitos e recebidos de forma manual, planilhas eletrônicas usadas como principal ferramenta, sem integração de dados, gerando retrabalhos e descentralização das informações.

Diariamente, estas empresas são acometidas por uma série de dificuldades, dentre as quais se destaca o chamado efeito chicote. Basicamente, este efeito é causado pelas distorções sofridas pela demanda em cada elo de uma cadeia de suprimentos. Quanto maior a variabilidade da demanda, maior é a dificuldade para fazer uma previsão de quanto produzir e quanto comprar. E quanto maior a dificuldade para fazer uma boa previsão, maior é a necessidade dos estoques de proteção.

Neste cenário, o VMI (Vendor Managed Inventory – Estoque Gerenciado pelo Fornecedor) surge como uma importante solução de visibilidade e integração para reduzir o efeito chicote. O VMI inverte a lógica comumente utilizada entre clientes e fornecedores para a reposição de mercadorias, onde é o cliente quem decide quando e quanto comprar do seu fornecedor. No VMI este controle é do fornecedor e as decisões são balizadas em políticas e regras de ressuprimento e de manutenção de estoques definidas de forma conjunta entre as partes. Para que a visibilidade, a integração e as regras de ressuprimento proporcionadas pela lógica do VMI ocorram com sucesso é fundamental a utilização de sistemas tecnológicos que automatizem os procedimentos de cálculo, bem como apresentem, de forma simples e integrada, a situação das vendas e dos estoques de cada elo participante do processo.

Além disso, alguns fatores muito importantes devem ser considerados em um projeto de implantação do VMI, desde a mudança cultural e a responsabilidade sobre o VMI até a confiabilidade dos dados e a definição de indicadores de performance. Baseado na experiência profissional dos autores, este artigo tem o objetivo de dar uma visão geral sobre o VMI, iniciando com a conceituação do efeito chicote e do VMI, passando pelas principais tecnologias envolvidas e finalizando com os principais aspectos a considerar em um projeto de implantação do VMI.

Efeito Chicote (Bullwip Effect)

De acordo com Chopra e Meindl (2003) quando há objetivos conflitantes ou quando as informações que circulam entre os estágios de uma cadeia de suprimentos são distorcidas, cada elo da cadeia tenta maximizar o seu próprio lucro, levando a ações que diminuem os lucros totais da cadeia de suprimento, prejudicando-a como um todo. Assim, as informações trocadas vão sendo distorcidas à medida que circulam pela cadeia de suprimentos, porque são incompletas e não são compartilhadas entre os diversos estágios. O resultado desta distorção é caracterizado pelo chamado efeito chicote (bullwhip effect).

Para ilustrar o efeito chicote, vamos imaginar a seguinte situação em uma típica cadeia de suprimentos e demanda: devido a uma promoção especial e pontual e já prevendo um aumento natural da demanda de determinado produto, o varejista realiza um pedido de compra maior para o atacadista. Este, por sua vez, recebe esta demanda fora do “padrão” e, sem ter o conhecimento da promoção do varejista, considera que tal comportamento irá se repetir nos períodos seguintes. Já prevendo um estoque de segurança maior para evitar possíveis rupturas futuras, o atacadista faz um pedido de compra maior para a fábrica.

Da mesma forma, a fábrica recebe este pedido e, para ter condições de atender a este “novo” comportamento de demanda, realiza pedidos de compra ainda maiores para os seus fornecedores, que, por sua vez, aumentam os seus
estoques de matéria-prima e de produtos acabados para “dar conta” da demanda.

O resultado destas distorções em cada elo da cadeia é o aumento da variabilidade da demanda e, consequentemente, o aumento da dificuldade em realizar uma previsão de vendas. O que as empresas fazem? Tratam de criar estoques de segurança com dimensões diretamente proporcionais ao tamanho da sua insegurança devido à falta de comunicação e colaboração ao longo da cadeia de suprimentos e demanda.

A figura 1 procura ilustrar o exemplo. Pode-se notar que a variabilidade da demanda é distorcida cada vez mais quando passa por cada elo da cadeia de suprimentos: do consumidor para o varejista, do varejista para o atacadista/distribuidor, do atacadista/ distribuidor para o fabricante e do fabricante para os fornecedores.

Lee et al. (1997) indicam que as principais causas do efeito chicote são: Processamento de variações na demanda: surge devido à falta de visibilidade que os elos da cadeia têm do real consumo dos produtos. Assim, a fábrica, por exemplo, realiza as suas previsões de vendas baseada no histórico de pedidos efetuados pelos clientes; Pedidos em lote: para diminuir os custos com o processamento de pedidos e com o transporte, bem como para atender o período de revisão dos estoques, as empresas procuram agrupar os seus produtos em lotes de compra. Estes lotes normalmente são maiores do que a real necessidade da empresa, amplificando ainda mais as variações das vendas; Flutuações de preços: quando são realizadas promoções, normalmente o cliente aumenta as suas compras para poder estocar produtos e garantir a disponibilidade durante o período de variação nos preços. Quando a situação é normalizada, os clientes voltam a comprar menos produtos, levando a uma distorção entre o padrão de compras e o padrão de vendas; Racionamento: quando há falta de produtos a tendência natural é que o cliente faça uma compra maior do que sua necessidade, procurando evitar que a falta ocorra novamente.

Inserido neste contexto está o VMI que, através do compartilhamento de informações, busca dar maior visibilidade das vendas e dos estoques ao longo de toda a cadeia para atingir os objetivos das estratégias de colaboração.

VMI (Vendor Managed Inventory) – Estoque Gerenciado pelo Fornecedor

No final da década de 90, alguns autores já destacavam as tendências da gestão da cadeia de suprimentos e demanda (CAMPBELL et al., 1998), dentre as quais se pode destacar o VMI, onde a administração dos estoques é feita em conjunto entre cliente e fornecedor.

O VMI inverte a lógica usualmente utilizada entre cliente e fornecedor para a reposição de mercadorias, onde é o cliente quem decide quando e quanto comprar do seu fornecedor. No VMI esta responsabilidade passa para o fornecedor e é embasada por políticas comerciais e algoritmos de ressuprimento e de manutenção de estoques.

Em termos práticos, o compartilhamento de informação entre fornecedor e cliente pode ser ilustrado conforme a figura 2. O cliente (representado na figura 2 por atacadistas e distribuidores, mas que também poderia ser um varejo) disponibiliza, em base diária, os dados das vendas realizadas e da posição dos estoques. O sistema VMI, em conformidade com as políticas comerciais e as estratégias de ressuprimento previamente celebradas entre as partes envolvidas, elabora um pedido levando em conta uma série de variáveis no seu cálculo, como, por exemplo, previsão de vendas, estoques máximo e mínimo, estoque de segurança, nível de serviço, classificação ABC, lead time de fabricação e de transporte, dentre outras.


Ao contrário do que muitos acham, o VMI não é apenas uma tecnologia que faz alguns pedidos de forma automática. O VMI é uma lógica de colaboração que envolve estratégias, processos, pessoas, tecnologia e indicadores de desempenho. Certamente a tecnologia é uma variável muito importante, mas para uma implantação de sucesso é necessário considerar todas as variáveis citadas.

Ao decidir implementar o VMI, deve-se buscar atingir uma série de objetivos convergentes e complementares, dentre os quais se destacam:

Ø Alinhar os objetivos e metas entre cliente e fornecedor e diminuir a distorção das informações trocadas: para trabalhar de forma colaborativa, cliente e fornecedor devem estar alinhados com os mesmos objetivos e metas, trocando informações diárias sobre alterações da demanda;

Ø Reduzir stock-outs (falta de estoques) e aumentar o nível de serviço aos clientes: o fornecedor mantém o registro diário do nível de inventário do seu cliente e assume a responsabilidade pela disponibilidade dos produtos, reduzindo a falta de produtos. Com os produtos disponíveis no momento certo e na quantidade adequada, o cliente é mais bem atendido e, naturalmente, fica mais satisfeito;

Ø  Reduzir o nível de estoques ao longo da cadeia: com a visibilidade das informações através do VMI, o fornecedor é capaz de controlar melhor o estoque do que o seu cliente, que tem produtos de diversos fornecedores para gerenciar. Com isso é possível diminuir o estoque de segurança, uma vez que o fornecedor analisa as informações com mais frequência e com maior detalhe;

Ø  Ampliar o volume de vendas e as margens sobre elas: devido à disponibilidade de produtos no momento certo e na quantidade adequada, os clientes sempre encontrarão aquilo que desejam, aumentando o volume das vendas. Além disso, com a redução dos custos de manutenção e gerenciamento dos estoques, a margem sobre cada venda é maior;

Ø  Alinhar a produção e a entrega do fornecedor com a real demanda do cliente: o fornecedor se planejará de acordo com as variações de demanda do seu cliente;

Ø  Aumentar o resultado individual e global de toda a cadeia: com o aumento das vendas e a redução dos custos, o resultado final é maior para todos.

O VMI cada vez mais se apresenta como um processo de melhoria significativa na crescente tendência de compartilhamento de informação ao longo da cadeia de suprimentos e demanda. A colaboração das informações possibilita que as empresas tomem ações conjuntas, dando maior transparência às relações. Além disso, o VMI é um exemplo do avanço da tecnologia que melhora o desempenho da cadeia de suprimentos (EMIGH, 1999).

No Brasil, algumas empresas utilizam o VMI para gerenciar seus produtos nos seus clientes e realizar os pedidos de forma automática, principalmente em setores como o de bebidas, higiene e limpeza e cosméticos. Mais recentemente, a indústria farmacêutica tem despertado para os benefícios do VMI, integrando as vendas e os estoques dos seus distribuidores, além de direcionar os esforços da equipe comercial para ajudar estes distribuidores a vender mais e melhor.

Benefícios do VMI

A lista de benefícios trazidos pela implementação do VMI, já comprovados por muitas empresas em todo o mundo, pode ser dividida entre cliente e fornecedor, a saber:

FORNECEDOR

Ø  Identificação das campanhas de marketing que dão maiores resultados de forma imediata.
Ø  Disponibilização de informação para que sejam tomadas ações específicas para aumentar a penetração em todos os eixos de atuação.
Ø    Ações específicas focando diferentes níveis de clientes.
Ø    Diminuição da falta de produtos e, consequentemente, aumento do nível de serviço.
Ø    Aumento das vendas devido à maior disponibilidade de produtos.
Ø  Redução da variabilidade da demanda e, consequentemente, maior capacidade para realizar uma previsão de vendas.


CLIENTE

Ø      Diminuição da falta de produtos e, consequentemente, aumento do nível de serviço.
Ø      Aumento das vendas devido à maior disponibilidade de produtos.
Ø    Maior visibilidade para realizar ações específicas e aumentar o giro em todos os produtos.
Ø      Maior controle e motivação dos seus vendedores.
Ø      Redução do trabalho manual para a consolidação de relatórios.
Ø      Foco na venda e não na compra.

Principais tecnologias envolvidas no VMI

Para operacionalizar todo o processo de VMI se faz necessária à utilização de tecnologias de informação que realizarão, dentre outros, o processamento dos algoritmos de ressuprimento, o intercâmbio eletrônico de dados entre cliente e fornecedor e a disponibilização de relatórios de performance.

Nesse sentido, o primeiro passo é descartar a utilização de planilhas eletrônicas, pois elas representam o oposto da proposta de colaboração, centralização e partilha das informações que o VMI preconiza. As planilhas eletrônicas não mantêm um padrão nos dados nem na forma em que são apresentados, pois cada usuário modifica de acordo com a sua vontade.

O resultado disso é uma grande variedade de formatos diferentes que, no final das contas, acabam representando a mesma coisa. Qualquer processo operado através de planilhas não pertence diretamente à empresa, mas ao seu usuário-criador. Muda usuário, muda planilha, muda processo.

A velocidade com que os dados são transmitidos é outro fator que pesa contra as planilhas eletrônicas. Geralmente elas são enviadas por e-mail ou compartilhadas em diretórios públicos, fato que gera a necessidade de uma ligação telefônica para saber se o usuário já recebeu os dados.

A internet como plataforma As ferramentas mais modernas de VMI funcionam através da rede mundial de computadores, ou seja, basta um navegador de internet (browser) para acessar o sistema. Este formato de disponibilização da ferramenta amplia o seu escopo, permitindo com que mais usuários possam acessar os dados transacionados.

Algumas empresas ainda apresentam grande aversão à disponibilidade dos seus dados na rede mundial. Entretanto, a segurança adquirida pela internet nos últimos anos permite definir e identificar quais usuários realmente podem acessar o sistema. Aliado a isto está a utilização de protocolos criptográficos, que fazem com que os dados fiquem totalmente indisponíveis para leitura caso sejam interceptados por agentes indesejados.

Outra tendência é o uso de nuvens computacionais (cloud computing) para o armazenamento dos dados e da aplicação. Estas nuvens possuem uma arquitetura inteligente que oferece maior disponibilidade, escalabilidade, flexibilidade e segurança. No final das contas, isto tudo representa custos menores para a implantação do VMI.

As principais vantagens em utilizar um sistema VMI via internet são:

Ø  Não é preciso se preocupar com a aquisição e a configuração de hardware, escolha de marcas, atualização tecnológica e provisionamento de capacidade futura.
Ø   Não é preciso se preocupar com a aquisição de licenças de software.
Ø Maior segurança dos dados devido à aplicação de uma série de equipamentos e tecnologias específicas, como certificados de segurança, antivírus, firewalls, patches de segurança etc.
Ø   Garantia de que, mesmo havendo problemas de funcionamento em algum componente do servidor, a aplicação não será afetada.
Ø   Permite que a empresa foque no seu core business, sem se preocupar com a manutenção da infraestrutura tecnológica.

Intercâmbio eletrônico de dados
Como pôde ser visto, a troca de dados entre empresas é fundamental para que o VMI obtenha êxito. Para o intercâmbio de dados entre cliente e fornecedor é necessário estabelecer uma comunicação eficaz entre as partes, ou seja, os dados precisam ser trocados de forma consistente e integral.

Nível de segurança do EDI e dos Webservices
Ainda hoje, o EDI (Electronic Data Interchange – Intercâmbio Eletrônico de Dados) é o padrão mais utilizado para a troca de dados no VMI. O EDI consiste em um conjunto de protocolos de comunicação padronizados que permitem o intercâmbio eletrônico de documentos entre empresas.

No EDI é necessário contratar uma VAN (Value Added Network – Rede de Valor Agregado) para garantir que os arquivos sejam trocados corretamente. A VAN estabelece uma comunicação privada entre dois pontos e permite o envio de documentos padronizados entre eles.

A experiência em diversos projetos tem demonstrado que muitas empresas que utilizam o EDI e as VANs passam por uma série de dificuldades devido à falta de validação da consistência dos dados, bem como à falta de transparência e agilidade quando ocorre alguma falha na transmissão.

De uma forma mais moderna e para suprir algumas deficiências do EDI e das VANs, as novas tecnologias de integração utilizam a própria internet para fazer a comunicação de dados entre cliente e fornecedor. No lugar das VANs são utilizados webservices de integração, que possuem a capacidade de processar os dados de uma forma mais rápida e confiável, além de permitirem uma série de verificações e validações na consistência dos dados.

Os webservices utilizam a própria internet do cliente e do fornecedor para o transporte dos dados, em contraponto às VANs, que utilizam redes privadas, acessíveis somente mediante contratação e pagamento para o fim específico de troca de dados.

Outra vantagem dos webservices é a flexibilidade para a integração de diferentes formatos de dados, incluindo o próprio padrão EDI . Esta flexibilidade dos webservices está muito alinhada à arquitetura orientada a serviços (SO A – Service-oriented architecture).

A tabela a seguir apresenta uma comparação simples entre EDI , através das VANs, e WEBSERVICES, através da internet.

Principais aspectos a considerar em uma implantação de VMI

Um projeto de implantação de VMI envolve diversos aspectos importantes que precisam ser considerados para atingir plenamente todos os objetivos. A seguir, são apresentados alguns desses elementos essenciais.

Parceria entre cliente e fornecedor

Em qualquer iniciativa de colaboração é necessário estabelecer uma lógica do tipo ganha-ganha. As políticas comerciais, os indicadores de performance, as metas de vendas, os parâmetros de estoques, enfim, todas as regras do negócio devem estar bem claras para todas as partes envolvidas.

Com um projeto de VMI a relação entre cliente e fornecedor precisa ser fortalecida, selando um vínculo onde todos devem sair ganhando. Esta quebra de paradigma é um avanço bastante considerável, pois, tradicionalmente e de forma equivocada, muitos clientes utilizam um poder de barganha maior para obter uma vantagem individual frente aos seus fornecedores.

Entretanto, na implantação do VMI as “regras do jogo” devem ser totalmente estabelecidas através de contratos, garantindo o cumprimento de tais regras. Certamente, tanto cliente quanto fornecedor só têm a ganhar se trabalharem como parceiros de negócio.

Mudança cultural

Como dito anteriormente, o VMI inverte a lógica normalmente utilizada entre cliente e fornecedor para a reposição de mercadorias. Com o VMI o cliente deixa de fazer aquilo que “sempre foi assim”, experimentando uma sensação de perda de controle no processo de ressuprimento.

Para lidar com este tipo de situação, o primeiro passo é reconhecer que isto irá acontecer, invariavelmente. O segundo passo é conduzir todo o processo com a maior nitidez possível, definindo estratégias claras e mostrando as reais vantagens que o cliente obterá com a parceria.

O terceiro passo é realizar treinamentos técnicos e conceituais para os níveis operacional, tático e estratégico do cliente, pois a maioria das pessoas não trabalha muito bem com aquilo que desconhece. Isto pode dificultar o dia-a-dia das reposições automáticas.

Por fim, recomenda-se iniciar o VMI de forma gradativa, deixando para um segundo momento a implementação de regras mais complexas que possam dificultar o entendimento inicial. Projetos-piloto, discutidos a seguir, são excelentes para ajudar na condução de toda a mudança trazida pelo VMI.

Projeto-piloto

Antes de partir para a implantação do VMI com todos os clientes, deve-se elaborar um projeto-piloto para validar as regras de negócio, as integrações e os acordos estabelecidos. Além disso, como vimos, o VMI causa impactos culturais no cliente e, por isso, deve ser conduzido de forma gradativa. Para o piloto, recomenda-se buscar clientes mais próximos (não mais que um ou dois), que apresentem maior abertura para uma integração.

Além das validações, o piloto é uma excelente oportunidade para coletar alguns resultados e utilizá-los nos roll-outs seguintes com outros clientes. A experiência em projetos de VMI mostra que um projeto-piloto bem conduzido é meio caminho para uma implantação de sucesso do VMI.

Existem empresas no mercado que possibilitam a aplicação do VMI através de pilotos ou mecanismos de visibilidade de estoques de forma rápida e simples. Desta forma, a empresa tem a real noção dos benefícios que este conceito pode trazer para a cadeia de suprimentos e demanda que ela está inserida.

Responsabilidade sobre o VMI 


A responsabilidade sobre o VMI deve ficar nas mãos da área de Logística e Supply Chain. Normalmente, esta área apresenta uma isenção maior frente ao processo, ou seja, não é influenciada pelo cumprimento de metas comerciais em detrimento às metas estabelecidas para o VMI. Isto não quer dizer que a área Comercial não deve participar do VMI; pelo contrário, o Comercial do fornecedor é um pilar fundamental em toda a lógica, ajudando o cliente a vender mais e melhor os seus produtos.

Desenvolver uma área de Logística e Supply Chain específica, caso a empresa ainda não tenha (tem crescido muito a criação de diretorias de SCM no Brasil), faz com que a organização foque as atividades relacionadas à otimização das relações entre fornecedor e cliente.

Integração e confiabilidade dos dados

Conforme visto ao longo deste artigo, o compartilhamento de dados entre fornecedor e cliente é fator primordial para o sucesso do VMI. Mais do que isso, é necessário que os dados sejam qualificados e trocados com frequência diária, sob pena de todo o processo de análise e ressuprimento automático não funcionar adequadamente.

Assim, recomenda-se despender o tempo que for necessário para ajustar os bancos de dados, tanto do fornecedor quanto do cliente. Neste sentido, é comum o próprio fornecedor auxiliar o cliente nestes ajustes, investindo em melhorias dos processos internos do cliente para otimizar a integração e a gestão da informação.

Indicadores de performance

O que não é medido não é gerenciado, e o que não é gerenciado não pode ser melhorado. Não há afirmação melhor quando o assunto é indicadores de performance.

No VMI, os indicadores que se referem à relação entre fornecedor e cliente devem ser estabelecidos desde o primeiro momento, pois é através deles que os envolvidos saberão se o VMI está dando retorno.

Os indicadores devem estar disponíveis de forma on-line e dinâmica, auxiliando nas decisões ao longo da cadeia de suprimentos e demanda. Alguns indicadores utilizados no VMI são, por exemplo:

Ø   Cobertura de estoques do cliente, em dias.
Ø   Positivação de clientes, ou seja, número de clientes diferentes que compraram ao menos um produto em determinado período.
Ø   Positivação de produtos, ou seja, número de produtos diferentes que foram comprados ao menos uma vez em determinado período.
Ø   Número médio de pedidos por mês.
Ø   Vendas médias por cliente positivado.

Algumas empresas vinculam o cumprimento de metas de vendas e/ou positivação de clientes em determinado período a bônus especiais em dinheiro.

Sistema de informação

A utilização da lógica do VMI exige a implantação de uma ferramenta tecnológica flexível o suficiente para integrar diferentes tipos de sistemas de clientes e fornecedores. Deve-se primar por sistemas de VMI que não impactem nos processos e sistemas dos clientes, ou seja, que não exijam alterações substanciais nos sistemas de gestão que o cliente utiliza.

Dessa forma, a decisão por um sistema de informação para operacionalizar a lógica do VMI deve considerar, dentre outros:

Ø    A utilização via internet, permitindo maior abrangência do sistema.
Ø    Uma plataforma robusta e que permita configurações específicas de forma ágil.
Ø  Uma interface ergonômica e intuitiva, facilitando a utilização do sistema por parte do usuário.
Ø   A integração via webservices, com diferentes validações de consistência dos dados.

Por fim, antes de escolher o sistema VMI recomenda-se verificar a disponibilidade do fornecedor de tecnologia para elaborar protótipos com dados reais, facilitando a escolha do sistema que seja mais aderente à realidade da empresa.

Considerações finais

As empresas que atuarem de forma efetivamente integrada com os seus parceiros obtêm ganhos mais expressivos do que os possíveis ganhos individuais quando a empresa trabalha de forma isolada. Esta evolução exige um completo reposicionamento de posturas gerenciais, sistemas de informação e processos existentes. E por mais complicado que isso possa parecer, é cada vez mais indispensável que as discussões considerem o papel dos demais parceiros envolvidos ao longo da cadeia de valor.

Inserido neste contexto e de forma sucinta, este artigo mostrou os principais conceitos e aspectos por trás do VMI, que é uma das principais iniciativas de colaboração entre empresas. Conforme foi apresentado, as empresas que aplicarem esta lógica com seus clientes e fornecedores, certamente terão grandes benefícios, aumentando a sua competitividade frente aos seus concorrentes.

Referências

Campbell, A., Clarke, L., Kleywegt, A., Savelsbergh, M.W.P.(1998). The inventory routing problem. In: Chan, L. M. A.; Federgruen, A.; Simchi-Levi, D. (1998). Probabilistic Analysis and Practical Algorithms for Inventory-Routing Models. Operations Research, v. 46, n. 1, p. 96-106, 1998.
Disney, S. M., & Towill, D. R. (2003). The effect of vendor managed inventory (VMI) dynamics on the Bullwhip effect in supply chains. International Journal of Production Economics, 85(2), 199–215.
Emigh, J. (1999). Vendor-managed inventory. Computerworld, 33(34), 52. Forrester, J.W. (1958). Industrial dynamics - A major breakthrough for decision-makers. Harvard Business Review, 1958.
Kaipia, R., Holmström, J. & Tanskanen, K. (2002). What are you losing if you let your customer place orders? Production Planning and Control, 13(1), 17–25.
SIMCHI-LEVI, David; KAMINSKY, Philip; SIMCHI-LEVI, Edith. Cadeia de Suprimentos: Projeto e Gestão. Porto Alegre: Bookman, 2003.
Trappey, C. V., Trappey, A. J. C., Lin, G. Y. P., Liu, C. S., & Lee, W. T. (2007). Business and logistics hub integration to facilitate global supply chain linkage. Yao, Y., Evers, P. T., & Dresner, M. E. (2007). Supply chain integration in vendor managed inventory. Decision Support Systems, 43(2), 663–674.

Autores

Eduardo Kazmierczak Neto
Graduado em Engenharia de Produção pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e pós-graduado em Logística pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Possui experiência em projetos em grandes empresas dos mais variados portes e segmentos, com ênfase em tecnologia de informação, S&OP, VMI e DSI. Atualmente é Diretor de Produto e Inovação da ACCERA Supply Chain Solutions. eduardo@accera.com.br

Diego Augusto Steffen
Graduado em Administração de Empresas e mestre em Engenharia de Produção pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS). Possui seis anos de experiência na área de Engenharia de Produção, com ênfase em modelagem e tecnologia de informação, sequenciamento fino da produção, simulação computacional, S&OP, VMI e DSI. Atualmente é Consultor da unidade de negócios de Supply Chain Intelligence na ACCERA Supply Chain Solutions. diego@accera.com.br


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